“O Sol e sua sombra
finalizam a Obra.
Clara chama do pólo, o Sol
não penetra a densidade dos corpos;
Portanto lhe permanece
oposta a sombra de todas as coisas:
Com certeza mais vil do
que elas, nem por isso é menos utilizada
Pelos Astrônomos, a quem
ela oferece muitas comodidades.
Porém mais numerosos sãos
os dons que aos Sábios o Sol outorga que,
Com sua sombra, oferece ao
trabalho da arte o Ouro de uma realização.”
Michael Maier
"O Sol e sua sombra terminam a obra.'
Michael Maier; Atalanta Fugiens, 1618 (ilustração
45)
Sobre os alquimistas, Jung
disse:
eles têm “nolens volens” (quer
queiram quer não), um compromisso com o inconsciente, e a variedade por assim
dizer ilimitada de suas imagens e paradoxos descreve uma realidade psíquica do
mais alto significado. Descrevem o caráter indeterminado, ou melhor, a
multiplicidade de sentidos do arquétipo, o qual representa sempre uma verdade
simples, mas que só pode ser expressa por um grande número de imagens. Jung (OC v.16, §497)
Esta citação descreve a
qualidade do arquétipo de se manifestar e se atualizar em imagens que se
desdobram, que se transformam, adquirindo novas formas e sentidos. O emblema “o
leão verde” é uma imagem entre muitas, um símbolo da força transformadora e criativa
do arquétipo, que assume novas formas, as quais trazem novas possibilidades de
sentido e de vida. Tais símbolos possuem dois lados: um deles refere-se ao
campo da experiência concreta, e o outro, ao da esfera psíquica ou espiritual.
Os símbolos alquimistas surgiram de uma consciência participante, que ainda
estava igualmente aberta aos dois lados.
Os alquimistas descreviam
o que eles viam em imagens surpreendentes. Em parte conscientemente e em parte
inconscientemente, eles tomaram do arsenal de imagens do cristianismo medieval,
mas também das antigas representações sobre a natureza. Jung tinha observado
tais imagens nos próprios sonhos e naquelas dos seus pacientes, e ele as
comparou com os modernos diários de sonhos ou com as séries de quadros pintados
a partir do inconsciente.
Ele ficou admirado quando os tratados alquimistas
abriram a ele um material de comparação. Ele os vivenciou como uma olhada no
mundo de imagens do inconsciente coletivo, e utilizou séries de imagens
alquimistas como meio de orientação para a compreensão de processos psíquicos.
Os diários de sonhos, séries de quadros de imagens e tratados alquimistas,
todos esses, dizem algo a respeito do “Processo de Individuação”, no qual a
psique de uma pessoa se estrutura e se regenera, e no qual é produzido sempre e
de novo um relacionamento entre o inconsciente e a consciência. Nisto está
implicado uma relativização do ego, sem a qual não seria possível um acréscimo
de autoconhecimento.
A matéria prima e obscura a ser trabalhada é o próprio
inconsciente do praticante; a transformação alquímica, um emblema da
transformação psicológica; e a opus alquímica dirigida à obtenção da pedra
filosofal, é vista como uma metáfora do processo de individuação, dirigido à
busca do Si-mesmo, através do reconhecimento dos diferentes complexos psíquicos.
MICHAEL MAIER
No emblema XX1 da atalanta
Fugiens, Maier escreve o seguinte:
“Do macho e da fêmea faz um círculo, depois, a partir dele,
um quadrado e a
seguir um triângulo.
Faz um círculo e terás a pedra dos filósofos.”
Era um autêntico homem da
Renascença, dominava diferentes áreas do conhecimento da vida; tinha doutorado
em filosofia e medicina e era médico do imperador Rudolph II em Praga e, após
sua morte, do conde de Moritz von Hessen.
Esta era uma época de
tendências contrárias - a reforma e a contrarreforma e, principalmente, o fim
de um paradigma e o começo de outro – o Iluminismo, a idade da razão. O Rei
Rudolf (1552-1612), reunia em torno de si cientistas, artistas e os
intermediários - como os alquimistas. Ele defendia a liberdade religiosa que,
no entanto, só se concretizou 100 anos depois. Ele ainda chegou a conseguir
manter juntos correntes opostas do espírito da época; tratava-se da reunião dos
opostos tanto no indivíduo, como na natureza e no mundo. Isto fica
especialmente claro no trabalho do seu médico de confiança e secretário
privado, Michael Maier.
O rei, através do estudo,
prática e meditação da música e alquimia, procurava purificar-se, integrar
tendências opostas em si mesmo, para poder lidar com os problemas do reino da
mesma forma. Um conhecido símbolo alquimista é um ninho com dois pássaros, um
dos quais deseja voar e, o outro, que ainda não tem penas, retém o primeiro. Aí
está refletido tanto um problema 6 químico - conjugar uma substância fugidia e
outra fixa - como também a situação espiritual daquele tempo. O Tratado
Alquímico Atalanta Fugiens A época da polifonia na história da música é a mesma
dos alquimistas medievais.
Michael Maier procurava
ilustrar os paralelos entre os motivos mitológicos e alquímicos e também
utilizou o simbolismo medieval na música para representar os mesmos processos.
Para isso, ele utilizou o mito grego Atalanta Fugiens como base para seu tratado, e escreveu sobre 50 gravuras em cobre com representações alegóricas, 50 poemas relativos a cada uma delas e ainda 50 fugas. Atalanta Fugiens representa um mesmo processo em três linguagens, “uma espécie de pedra de roseta que permite traduções em diversas direções”:
Os emblemas,
individualmente, são ilustrações dos mitos greco-egipcios, que Maier havia
acumulado ao longo do seu aprendizado e também os frutos da sua experiência
como médico. Os textos provêm em grande parte da Tabula Smaradigma, de Hermes
Trimegisto e são ricos em conteúdo de sabedoria alquímica. As fugas – 50
pequenas composições, com uma mesma estrutura geral, na qual duas vozes
dispostas sobre um Cantus Firmus constituem um relacionamento específico entre
duas linhas musicais, intermediado por uma terceira.
Consideradas
individualmente, as fugas procuram reproduzir o mesmo significado de cada
emblema e texto. Mas no seu conjunto, nas mudanças estruturais que ocorrem de
uma a outra fuga, elas vão reproduzir os acontecimentos marcantes na estória do
mito. 7 É importante notar que as fugas e emblemas não são destinados
exclusivamente ao entretenimento e nem tampouco são a expressão de emoções
pessoais, como vem a acontecer num período posterior da história da música.
Mais, sobre esse estudo, no ATALANTA FUGIENS E A FUGA
Mais, sobre esse estudo, no ATALANTA FUGIENS E A FUGA
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